quarta-feira, 26 de fevereiro de 2020

Poema "A uma pintura"


A UMA PINTURA

Abro os meus olhos como duas janelas,
uma delas para te ver,
a outra para te escrever.

E observo…
Vejo a doçura dos teus olhos densos…
Densos e calmos.

E vejo a meiguice de menina traquinas que sonha,
e sonha com poesia e liberdade.

Nos teus lábios vejo um infindável mar…
de águas calmas e sensualidade.

Será, talvez, um mar de versos
que tanto gostaria de escutar.

Mas também um mar diverso
onde gostaria de mergulhar
todas as minhas palavras,
as que te digo e as que te escrevo,
e as que não te sei dizer.

E eu fico somente pela minha pequenez,
de quem não te sabe descrever…

José António de Carvalho, 28-janeiro-2020
Pintura de Belmiro Mendes da Costa




Poema "Narcisismo"

NARCISISMO

Naquele ar imperador
A olhar com sobranceria
Quem estava em seu redor
Num cio que o embevecia.

Talvez tivesse escolhido
Coligir a obra de outro homem
Naquele ar de aborrecido
A quem os atos consomem.

No tempo que lhe foi dado,
Fê-lo com todo o primor
Falando desse passado
Elevando-se um senhor.

Pouco resta desse dia,
Se as nuvens apareceram
Com elas só a poesia
Que os outros escreveram.

José António de Carvalho, 26-fevereiro-2020
Pintura "Narciso" (1594-1596), Caravaggio



quinta-feira, 20 de fevereiro de 2020

Poema "Hoje não. Amanhã talvez!..."

Hoje não. Amanhã talvez!...


Se soubesse o teu caminho
tomaria sempre um rumo diferente do teu.
Um rumo que nos permitisse ver olhos nos olhos
e pudéssemos apenas fitar os olhares receosos,
como a fera e a presa, e a presa e a fera.

Esta bilateralidade do ver teria de ser mantida e respeitada.
Eu tentaria escapar sempre às tuas investidas
e tu recear-me-ias pelo meu olhar decidido,
porque não era chegada ainda a hora para o nosso encontro.

E que ninguém se permita a decidir por nós,
forçando encontros inusitados pelo caminho,
num caminho que não quero nosso, o meu e o teu.

Quem sabe se um dia não possa mudar de linha…

E, no meio dos meus cansaços de viver só,
no meio das minhas angústias e dores dilacerantes,
no meio da poeira dos meus versos secos
ou dos invernos -infernos- gelados e soturnos,
nas incoerências da chegada do rio
a um mar revolto de dor e lágrimas salgadas,
e neste meu solitário e já penoso caminhar,
possa dizer a alguém que nos junte o caminho…

E será como que o fim do mundo.

E a fera... a fera atingirá mortalmente a sua presa.

José António de Carvalho, 20-fevereiro-2020
Pintura de Monteiro da Silva



quarta-feira, 19 de fevereiro de 2020

Poema "Brinca hoje, Carnaval"

Concurso de Carnaval - 2020 do Grupo Mel Poesias

Brinca hoje,
Carnaval

Deixa voar o pensamento,
Deixa que o riso vá no vento,
Deixa que o coração abrace
Num abraço que enlace…

Deixa correr essa folia,
Sente o batimento da alegria,
Deixa suspenso o porvir
E sossega o conseguir…

Aproveita esta ocasião,
Porque o amanhã será ladrão
Da alegria que tens hoje
E que da carne te foge!!!

José António de Carvalho, 18-fevereiro-2020
Foto net



segunda-feira, 17 de fevereiro de 2020

Poema "(Uni) diversidade"

A propósito do acontecimento de ontem no Estádio D. Afonso Henriques, em Guimarães, tinha este poema feito e aproveito para partilhar convosco.

DISCRIMINAÇÃO - Não se trata apenas da diferença de cor, porque, diferenças, existem em muitas outras dimensões do ser humano, e são alvo de discriminação e intolerância, até pela forma como as pessoas se apresentam e comunicam.
A diferença deve unir-nos!... 

Participei com este poema no concurso organizado pelo Grupo Arte & Literatura Recanto da Poesia, Encontro Pôr do Sol, tema: "Os Anjos não têm Cor"


“Uni” diversidade

Como este mundo é tão diverso
Na cultura e no viver também.
Se posso fazer um lindo verso
A prosa e o poema são o reverso
Da moeda que ninguém detém.

A poesia é livre e sempre voa
Em mundo atado na diferença
E quando dizem que a cor destoa,
Se assim o dizem é tão à toa…
São palavras ocas e sem crença.

Somos todos iguais na razão,
Nos direitos, também nos deveres.
Ajudar quem pede a tua mão,
Se o fizer sem ter outra intenção...
A tua ofereces se puderes.

Não olhes se é folclore ou fado,
Se dança ao nascer ou morrer,
Pinta o rosto e põe filho ao lado,
Amanha a terra à enxada e arado,
É cultura… dada p'lo nascer.

José António de Carvalho, 07-fevereiro-2020
Foto net






quinta-feira, 13 de fevereiro de 2020

Poema "Cedências e reticências"

Cedências e reticências

Sinto a tua mão
sobre a minha,
levemente,
e o coração pungente,
também se sente…

Sinto os teus dedos
Leves, sobre os lábios,
desvendando segredos,
secretamente guardados
nos vãos dos nossos medos
e nos pelos arrepiados…

Sinto esses beijos
nas bocas sufocados,
são nosso flamejo
em vales encantados,
dos corpos em desejo
nos astros alcançados.

Sinto o teu calor
recreando-se em mim,
como fonte de fulgor
para dizer – sim!
Assim… por favor!
Fica assim…
Meu amor!
É dia de São Valentim!

José António de Carvalho, 14-fevereiro-2020
Pintura “Magia”, Monteiro da Silva 


Poema "Apostas"

Apostas

O céu hoje vestiu-se de cinzento
Como uma fria espera na antecâmara,
Envolta de um escuro pardacento
e vestes com laivos de desalento
Pelos galhos que a vida p’ra si chama.

Não é desembrulhar o sofrimento…
É mais o embrulhar da minha esperança,
Que vai voando como o pó no vento,
Em fio resistente que ainda alimento
Sem perder a linha da temperança.

A realidade é um sortimento
De fugas, com a verosimilhança
A uma loba penando ferimento
Em uivos de agonia no momento
De vida e morte. Apostas na aliança...

José António de Carvalho, 12-fevereiro-2020
Foto de Conceição Silva


segunda-feira, 10 de fevereiro de 2020

Poema "Raízes e palavras" p/ a Cidade Hoje, Rádio e Televisão


Poema da comemoração do 30º aniversário do programa "As nossas raízes" da Rádio Cidade Hoje, Jornal e Televisão - do Círculo de Cultura Famalicense.

Homenagem aos amigos Manuel Sanches e Suzy Mónica Sanches (apresentadores do programa).

Raízes e palavras

São vozes… sabe-se lá de onde?
Que falam tão rapidamente,
Se lhes falo, ninguém responde…
Serão mesmo vozes de gente?

Palavras que entram pelas casas
Na pele da espuma das ondas,
Gaivotas brancas… só com asas.
Ouve em silêncio e não respondas...

Falam com alguma piada
Que são da Cidade Hoje, Rádio:
 “- No ar… dia e noite e madrugada!”
Falam para um vasto auditório.

Hora certa para as notícias
De Famalicão e da cidade,
Seguidas de algumas delícias
Lançadas em publicidade.

Como o programa abre em boa hora,
Entre as dezoito e vinte e uma,
Pra que ninguém fique por fora
Há que ouvir as dicas, uma a uma.

A poesia é uma arte
Com um bom lugar nesta mesa,
Difundida por toda a parte
na sua jovial beleza.

A volta inteira ao Concelho,
Andar por festas, romarias
Deste povo, o melhor espelho
De tantas... tantas alegrias.

A música da nossa terra
Desta nossa Famalicão
Tem presença, depois encerra
Na terceira hora, pois então.

Como o tempo voa tão rápido
Mais veloz do que um gavião
Desde a grande estreia na rádio
Raízes de Famalicão.

Assim se plantam as raízes
com história, longevidade,
Foram trinta anos tão felizes…
Mais virão, com estoicidade.

E aos mentores do programa
Ambos Sanches como apelido
Salva de palmas os aclama
P'lo tempo que lhe és retido.
  
Uma salva de palmas para: Susy Mónica e para o pai Manuel Sanches!... Também para a Cidade Hoje, Rádio, Jornal e Televisão.


Poema de José António de Carvalho, 29-janeiro-2020











domingo, 2 de fevereiro de 2020

Poema "COORDENADAS"

Este poema foi lido, ontem, 20-fevereiro-2021 (sábado), no programa "As Nossas Raízes", da Cidade Hoje Rádio, da autoria de Manuel Sanches e Suzy Mónica.


COORDENADAS

Os dias nascem na vertigem das nossas noites
Para se evaporarem no meio de medos hesitantes
Receando perderem-se entre as vagas do alto-mar,
Ou do veleiro que evolui precipitando-se em frente
Até se perder de vista nos confins do horizonte.

São registos surdos e latejantes dos tempos,
Ápices escondidos a desenrolar de versos e mais versos
Na ânsia de ver nascer um poema seu filho legítimo,
Legítimo de sangue, sentimento e de sentido.

Um poema legítimo dentro da legalidade de ser
Um poema que é sonho noutro sonho que se quer ter,
O quadro do veleiro esfuma-se num mar de segredos
Como a vida que nos foge por entre os dedos...

José António de Carvalho, 02-fevereiro-2020
Pintura de António Miranda


quarta-feira, 29 de janeiro de 2020

Conto de Natal "Onde é El dourado”


Este conto de Natal baseia-se em factos verídicos, mas com nomes de personagens e locais fictícios.

Onde é "El dourado”

Um jovem casal oriundo do Rio Grande do Sul cumpriu a sua licenciatura em Portugal. Foram cinco anos espetaculares de estudo, convívio e criação de laços com a cultura portuguesa e europeia. Porque nas férias, nem sempre iam ao Brasil, aproveitaram para conhecerem não só Portugal como outros países da Europa.

Finalizado o curso regressaram à sua terra e começaram a sua vida profissional. Ele na área financeira duma empresa, ela foi trabalhar na Prefeitura da cidade de Eldorado do Sul, que dista cerca de catorze quilómetros de Porto Alegre, capital do estado do Rio Grande do Sul. E foi nesta cidade de Eldorado que o jovem casal comprou uma pequena vivenda familiar. Embora relativamente longe do lago Guaíba, tinham uma vista deslumbrante sobre a cidade e sobre o lago, onde o nascer do Sol espelhava nas águas calmas e abria enormes feixes luminosos por entre prédios e ruas.

Todavia, a economia brasileira complicara-se nos últimos anos.  A jovem, de nome Erica, perdeu o seu trabalho em 2016. E, passado pouco mais de um ano, o Gilberto, o marido, ficou também sem trabalho. Esta situação complicou-lhes a vida de tal modo que tiveram de vender a vivenda. Saldaram a dívida ao banco, e pouco dinheiro lhes restou para tentarem uma nova vida em Portugal.

Esta aventura levara-os à cidade de Guimarães, onde nasceu Portugal, e onde começaram a trabalhar, ajudados por um casal amigo que se aventurou em terras lusas dois anos antes. O jovem casal contactou antigos colegas de faculdade, dizendo-lhes que estavam novamente em Portugal. Claro que todos ficaram satisfeitos por eles regressarem, mas não discerniram as verdadeiras razões para o acontecido.

Existiram alguns encontros entre os colegas, no entanto, só um dos amigos vislumbrou que as coisas não estariam animadoras, longe disso, a Erica estava sem trabalho e o Gilberto trabalhava clandestinamente numa pastelaria.

Até que o Pedro (o amigo português) perguntou-lhes:

- “Gilbes”, vocês não estão muito animados, pois não? Está tudo bem com vocês?

- Tudo bem “Peter”! Passa-se… é que temos de conseguir o “visto” português para podermos trabalhar e termos assistência social, e não corrermos o risco de repatriação. A situação está complicada!

O Pedro para os animar convidara-os para jantar na casa dos seus pais. Mas que precisaria de falar primeiro com eles. O Pedro falou com os pais, tendo ficado combinado ser na noite Natal. O Gilberto e a Erica ficaram contentes porque iriam passar o Natal sozinhos. Mas faltavam ainda quatro semanas para o dia.

Chegados ao dia de Natal, estavam todos sentados à mesa, o Gilberto e a Erica já eram conhecidos e amigos dos pais do Pedro desde os tempos de faculdade.

O Gibes levantou-se e disse:

- Tenho uma novidade!

Todos ficaram expectantes e reagiram: - Força! Venha essa novidade!

- Consegui o visto para viver em Portugal, fazer contrato de trabalho e usufruir de direitos. 
Aqui também é o meu país!

Todos ficaram felizes pela notícia. E o Gilberto dirigiu-se à avó do Pedro que também estava no jantar de Natal.

- Vó, estamos tão felizes!...

Todos exclamaram a sua admiração: - Vóóóóó????

- Não tem mal esse engano, Gilberto! (exclamou a mãe do Pedro)

- Se ela é a avó, nós somos a vossa família portuguesa! Acrescentou.

E assim ficaram transformados laços de amigos e conhecidos em laços de família, com abraços, beijos e um brinde à saúde, no que foi um…

FELIZ NATAL.

José António de Carvalho
Vila Nova de Famalicão


segunda-feira, 20 de janeiro de 2020

Poema "Preciso de Quatro Tempos"

Preciso de quatro tempos  

Preciso do tempo de nascer
E de renascer alvo e puro,
Que mate o ontem, negro como um corvo.
Que seja um tempo colorido
Que defina o caminho da primavera,
O caminho da natureza, da harmonia e do sol.

Preciso de outro tempo do crescimento,
Um tempo que se agigante ao tempo,
Que asfixie os monstros sobreviventes  
E extermine o passado, o erro e o medo,
E abra as portas da esperança num grito silencioso,
Para que o andar no tempo seja preciso
E decidido a caminhar no caminho do tempo.

Preciso do tempo de viver,
Dum tempo dentro doutro tempo.
Um tempo líquido, corrente e puro
Com a doçura do mais doce fruto maduro
E a beleza de um pôr de sol no horizonte mais límpido.
Preciso do tempo de todos os tempos…


Preciso do tempo para ser,
Hoje, agora, já, o que não consegui ser…
Para poder ser mais do que era,
Apenas o tempo de ter tempo
Para no tempo nascer e renascer.
E nele crescer aprendendo a viver,
Antes de morrer…

Mais não posso querer!

José António de Carvalho, 20-janeiro-2020
Foto Conceição Silva



Conto "Do Dever ao Sonho"

 Conto a concurso  do Vale do Varosa "O rio, o vale e as gentes", da Câmara Municipal de Tarouca

Conto
“Do Dever ao Sonho”

O dia surgiu sôfrego e quente. Outubro, não era habitual um nascer de dia assim, que mais parecia um daqueles amenos dias de Verão. O relógio avançou rapidamente e apressado em chegar ao seu destino. Talvez por ter entrado a hora de inverno no último fim de semana.
Francisco Botas é promotor imobiliário de profissão, e a sua namorada Sara – Botas por afinidade – trabalha na mesma imobiliária, na parte administrativa. Mas Sara vende e compra tantas casas como o seu companheiro Francisco, mais conhecido por Chico Botas.
O Chico Botas planeava um passeio pelo interior. Um passeio misto, juntando o “lazer e o profissional”. Fez um esquema do que seria um fim de semana prolongado, aproveitando o feriado municipal de Tarouca que comemora o S. Miguel, que alguém lhe teria dito, erradamente, que seria no final de outubro. Mas como da ideia para a prática vai para além da vontade de cada um, ficando-se apenas e tão só pela realidade, o feriado municipal de Tarouca ocorreu no final de setembro (mês anterior) e fora ao domingo, embora as festividades decorressem ao longo de toda a semana precedente ao feriado.
Diz o Chico para a sua Sara:
- Ó minha pequenina Sarita, estava aqui a planear fazermos um fim de semana que coincidisse com o feriado municipal em Tarouca, mas para azar nosso o feriado lá é a 29 de setembro, ou seja, já foi! – Disse o Chico algo desapontado.
-  Pois!... Lá se foi o nosso objetivo de ter muita gente lá concentrada para promovermos a nossa imagem e o negócio! – Verbalizou a amada.
- Mas não importa, faremos o nosso trabalho com as pessoas que por lá andarem! – Acrescentou a Sara.
- És sempre genial a solucionar as minhas hesitações. Manteremos então a ideia de irmos lá promover os nossos imóveis para o fim de semana!
Mas Sara, muito astuta, acrescentou ainda:
- E por que não aproveitarmos de 1 a 3 de novembro, que é de sexta a domingo, e apanharmos as pessoas mais concentradas na cidade por causa do Dia de Todos os Santos e, no dia seguinte, o Dia dos Fiéis Defuntos?
- Excelente ideia! És uma estratega exímia! – Disse satisfeito o Chico.
- E ainda ficaremos com o domingo para ver o que há lá de bom e bonito! – Acrescentou a Sara. E continuou:
- Quem sabe, não iremos encontrar o castelo ou palácio dos nossos sonhos para morarmos?!...
Olharam-se e sorriram, terminando a conversa com boa disposição e com a visita a Tarouca já decidida.
Mas o Chico, sempre minucioso nas decisões, lá continuou com as suas ponderações (que Sara diz ser um “miudinho”) para planear ao pormenor uma qualquer viagem, seja ela curta ou longa, e as suas ações de promoção de imagem e do negócio.
O objetivo do casal, dada a distância da sua terra, não era a de encontrar lá clientes com imóveis para vender ou comprar na própria terra (Tarouca). Mas antes, pensavam nas pessoas que quisessem “fugir” do interior e prestar-lhes o serviço de mediação na aquisição de habitação no litoral. Porque é por todos sabido e conhecido, muito pela ajuda da comunicação social, que as pessoas vão fugindo em debandada do interior para o litoral na expectativa de conseguir melhores condições de vida (saúde, educação para si ou para os filhos, habitação, maior proximidade do mar pelo clima mais ameno, perspetiva de férias e de fins de semana na praia, mas sobretudo pela maior oferta de trabalho).
O Chico e a Sara já tinham tudo preparado. Decidiram que ficariam hospedados, de sexta a domingo, num espaço de casas individuais com vista para o rio Varosa, que passa perto do empreendimento turístico. Depois, dali, sairiam para as dez freguesias do concelho, embora administrativamente sejam apenas sete.
Ainda cedo, no dia 31 de outubro, puseram-se a caminho, seguindo pela A7 e depois A24. Fizeram uma curta paragem para um café no alto do Soajo e depois em Vila Real para um pequeno lanche matinal e desentorpecer as pernas.
De novo na estrada seguiram em direção a Viseu pela A24, saindo em Lamego para apanharem a EN 226 para Tarouca.
Já na cidade, foram diretos ao edifício sede do concelho, desenhando em pensamento uma homenagem a todos os tarouquenses e seguiram para a casa que os esperava, onde colocaram os seus pertences e foram dar uma vista “d’olhos” por algumas ruas da cidade.
Estacionado o automóvel perto do edifício da Câmara Municipal, dirigiram-se para a zona histórica da cidade até à Igreja de São Pedro de Tarouca. Um templo medieval que sofreu alterações por várias vezes e onde estão sepultados o Conde de Marialva e a sua mulher.
- Humm… estou a gostar do que vejo! – Disse o Chico para a Sara.
- Os túmulos deixam-me triste! – Respondeu ela. E continuou: - Mas a vida é mesmo assim… temos limites em tudo, e a vida é disso um bom exemplo!
O Chico concordou com ela dizendo-lhe “sim” com a cabeça, esboçando um sorriso para a sua amada. E pensou para si: “ela tem sempre razão”.
- Anda daí. Vamos entrar no mosteiro! – Acrescentou o Chico
Compraram os bilhetes (2 x 3,00 €) e lá entraram no mosteiro, tendo feito uma visita rápida, mas atenta, e ouviram todas as explicações e descrições que lhes foram dadas.
Ficaram bem impressionados com a visita ao mosteiro e com todas as informações que lhes foram dadas. Aí começaram a perceber um bocadinho melhor a importância daquela terra noutros tempos e das suas gentes. Além de, também, começarem a interiorizar que o êxodo das populações do interior para o litoral do país é um problema muito grave e que deveria ser combatido. Em seguida foram almoçar, já era muito tarde.
No restaurante disseram que queriam o prato mais típico da terra. Foi-lhes dito pelo empregado do restaurante, que o prato típico daquela época do ano era a marrã, e que deveriam acompanhar com um bom vinho tinto maduro.
- Seja o que diz!  E pode trazer o pãozinho da região nas entradas? – Acrescentou o Chico.
E assim foram evoluindo no seu conhecimento de Tarouca, se os olhos gostaram do que viram, as papilas gustativas estavam já a assimilar os primeiros “embalos” das entradas.
- O presunto e o pão são divinais! Exclamou a Sara.
O Chico apenas lhe acenou com a cabeça com um “sim”, porque não podia falar, a boca estava ocupada a deliciar-se com um dos prazeres da vida, a boa comida.
Terminaram o almoço e tomaram café ali mesmo no restaurante. Pagaram a conta e perguntaram se tinham livro de honra, ao que o empregado sorrindo respondera:
- Temos honra, mas não em livro!
- Então um guardanapo de pano ou papel também serve. Pode ser? – Interrogou o Chico.
- Oh, deixa lá. Não vais estragar um guardanapo de pano?! – Ingeriu-se a Sara.
- Não estraga nada, bem pelo contrário! Aqui tem! - Respondeu o empregado do restaurante.
O Chico pegou numa esferográfica e escreveu: “Eis-nos aqui em Tarouca / agitando o paladar / mas que consolo pra boca / cresce a intenção de voltar!!!”. E assinou. A Sara assinou ao lado e desenhou um sorriso e saíram.
Seguiram para Ucanha, para verem a famosa ponte romana sobre o rio Varosa e a sua torre. E ajeitaram-se para tirarem uma “selfie” na entrada do arco da torre sobre a ponte. Enquanto o faziam, o Chico sussurrou ao ouvido da sua Sarita “É tudo tão lindo e tão simples… Sinto-me como um rei aqui! E tu és a minha rainha!”.
Ela respondeu-lhe e sorriu: - Eu sou a tua rainha em todos os lugares e não só aqui!
Depois tomaram rumo a Salzedas, e novo deslumbramento os invadiu, desde o piso em granito das ruas, os muros, as casas, a belíssima e imponente igreja do mosteiro e o próprio mosteiro. O jovem casal ficou rendido a algo que para eles era totalmente novo e surpreendente, pois situava-se num patamar muito além do que esperavam.
- Sarita, minha linda, eu não sou capaz de empreender para a saída de pessoas desta terra, porque eu próprio gostaria de aqui viver!  Espero que me compreendas e aceites este meu dilema!
- Claro que compreendo! Tenho idêntico sentimento! E continuou a Sara, no seu habitual espírito livre e decidido:
- Mas podemos muito bem fazer o mesmo trabalho, mas no sentido inverso. Arranjaremos aqui casas para as disponibilizarmos a clientes da nossa área que pretendam dar passos para o paraíso! O que achas?
O Chico não respondeu. Ficou ainda mais indeciso sobre o objetivo que ali os levou e o que a vontade deles agora pedia. Perdendo-se no silêncio a ver as mensagens no telemóvel. Mas por pouco tempo, porque o telefone tocou. Atendeu, e disse para a Sara: “- É da receção!”
Pediam-lhe para passarem pela receção. Respondeu de pronto, que iriam antes do jantar. E foram poucos minutos depois.
Na receção a menina disse-lhes que tinha lá estado uma pessoa do restaurante onde eles almoçaram e que lhes trouxe uma carta do Sr. Presidente da Câmara de Tarouca. O Chico pegou na carta e agradeceu à menina. Era um convite para assistirem à cerimónia de entrega dos prémios do Concurso Literário “O rio, o vale e as gentes”, e nas costas do convite estava escrito:
Eis-nos aqui em Tarouca / agitando o paladar / mas que consolo pra boca / cresce a intenção de voltar!!!”.
“Que o V/ regresso se faça em breve tempo e para a gala literária “O rio, o vale e as gentes. São meus convidados!”
E assinou: “O Presidente da Câmara de Tarouca”
Os dois jovens abraçaram-se de felicidade, olharam-se e sorriram.
José António de Carvalho